Podcast sobre a materia – ouca no Spotify
Enquanto o mercado celebra inteligência artificial, empresas brasileiras apostam em segurança
Se você acompanha o noticiário de tecnologia, provavelmente ouve falar de inteligência artificial todos os dias. Mas há uma desconexão significativa entre o hype e a realidade dos negócios brasileiros. Nesta quinta-feira (13/11), dados divulgados pela Logicalis revelam que a IA não figura nem como primeira nem como segunda prioridade em tecnologia para as companhias do país. A segurança cibernética é quem lidera as atenções — e por boas razões.
Segurança em primeiro lugar: 80% das empresas priorizam proteção digital
De acordo com o IT Trends Snapshot 2025, desenvolvido pela Logicalis em parceria com a consultoria Stratica, a segurança cibernética é a prioridade número um para 80% das empresas brasileiras. Em segundo lugar, vem a automação de processos (49%), e apenas em terceiro aparecem projetos de inteligência artificial e machine learning (42%).
Márcio Caputo, CEO da Logicalis, explica o cenário: “Os clientes falam que falta para entrar com tudo em IA, seja capacidade de processamento, dados de qualidade e decidir se fará na computação em nuvem ou em data center próprio”. A mensagem é clara: não é falta de vontade, é falta de estrutura.
O paradoxo da segurança: tecnologia avança, mas cultura não acompanha
Um relatório complementar, que gerou o Índice de Maturidade e Risco Cibernético (IMRCiber), traz dados ainda mais preocupantes. Apenas 35% das empresas brasileiras envolvem equipes de segurança no desenvolvimento de novos produtos. Isso significa que duas em cada três companhias estão criando soluções sem pensar em proteção desde o início.
O estudo ouviu cerca de 350 profissionais e constatou que o país opera em nível intermediário de maturidade cibernética, com média nacional de 60%. Em termos técnicos, há avanços: 87% das empresas já contam com firewall ativo e 52% utilizam autenticação multifator em sistemas críticos. Mas a defasagem é evidente — 43% ainda não aplicam Inteligência Artificial de forma prática, embora 68% reconheçam seu valor estratégico.
O maior gargalo, porém, está na liderança e na cultura organizacional. 59% das companhias não traduzem riscos cibernéticos em linguagem compreensível para a alta gestão, e 57% não têm clareza sobre seu próprio apetite de risco.
IA já transforma crédito, mas com ressalvas
Nem tudo é pessimismo. No setor de crédito, a inteligência artificial já é uma realidade consolidada. A ANBC (Associação Nacional dos Bancos de Crédito) divulgou, também nesta quinta, que a IA vem mudando significativamente a forma como empresas e consumidores se relacionam com o sistema financeiro.
Os números impressionam: automação pode reduzir custos em até 66% e acelerar o desenvolvimento de modelos que antes levavam semanas — hoje são concluídos em poucos dias. Em uma das principais empresas do setor, mais de 70% dos novos modelos criados em 2023 incorporaram machine learning e deep learning, aumentando em 20 vezes a velocidade de processamento de dados.
Mas há um detalhe importante. Segundo Fabio Hashimoto, citado no estudo da Logicalis, apenas 3 em cada 10 empresas afirmaram já ter conseguido tirar resultados tangíveis das iniciativas de IA. O problema? A maioria ainda está em fase de experimentação, sem ROI claro, casos de uso bem definidos ou governança adequada.
Startups em missão: o Brasil se internacionaliza
Enquanto isso, o ecossistema de startups brasileiras segue em expansão internacional. Nesta semana, dez startups selecionadas pelo programa SP Global Tech (Secretaria de Ciência, Tecnologia e Inovação de São Paulo) participam do Web Summit Lisboa, considerado um dos maiores encontros de tecnologia do mundo, com mais de 70 mil participantes.
Em paralelo, a startup Dynadok participa do Missão 4CIO 2025, em Porto de Galinhas (PE), conectando empresas e startups brasileiras ao mercado americano de TI. O evento reúne mais de 70 empresas estrangeiras, incluindo Sumitomo Chemical America, Scotiabank USA e New York Life Insurance. Willian Valadão, cofundador da Dynadok, apresentará soluções da empresa a CIOs dessas corporações, com planos de expansão internacional em 2026.
Investimentos em talento: Brasil lidera salários na América Latina
Um ponto positivo: o Brasil é líder na América Latina em remuneração para profissionais de tecnologia. Segundo o relatório The State of Global Compensation 2025 da Deel, que analisou mais de 1 milhão de contratos em 150 países, engenheiros e cientistas de dados brasileiros recebem, em média, US$ 67 mil por ano.
Mas há uma preocupação: os CIOs expressaram que o aumento nos orçamentos pode não ser suficiente para cobrir os custos crescentes com mão de obra especializada, inflação e possíveis desvalorizações cambiais.
O que muda para você?
Este cenário tem implicações práticas. Se você trabalha em uma empresa, espere mais investimentos em segurança antes de grandes projetos de IA. Se você é empreendedor, a mensagem é: segurança desde o início não é apenas compliance, é diferencial competitivo. Se você busca carreira em tech, o mercado brasileiro segue aquecido, mas com foco em especialistas que entendam tanto de dados quanto de proteção.
A realidade é menos glamourosa que os headlines sobre IA generativa, mas muito mais pragmática. O Brasil está construindo uma base sólida antes de correr. A questão é se essa velocidade será suficiente diante da concorrência global.
Photo by Growtika on Unsplash





